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terça-feira, 30 de outubro de 2012

MPT pede cassação de "selo social" concedido a usinas pelo Planalto



Ostentado por 169 usinas sucroalcooleiras de todo o país e apresentado solenemente pela Presidência da República (PR) como materialização de um processo exemplar de "concertação social" (envolvendo poder público, patrões e representantes sindicais), o selo de "empresa compromissada" com a melhoria das condições de trabalho no setor da cana-de-açúcar é, segundo sete ações civis públicas protocoladas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), um poço de "problemas, falhas, equívocos e fraudes".

Assinadas pelo procurador do trabalho Rafael de Araújo Gomes, as ações pedem a suspensão imediata da divulgação e do uso do "selo de conformidade" tanto pelo governo federal como por sete empresas "certificadas" que se situam no espaço jurisdicional da Procuradoria do Trabalho em Araraquara (SP). Estão entre as usinas citadas pelo MPT: duas pertencentes ao grupo Raízen - em Ibaté (SP) e Araraquara (SP) -; Irmãos Malosso, em Itápolis (SP); São José da Estiva, em Novo Horizonte (SP); Santa Fé, em Nova Europa (SP); Ipiranga, em Descalvado (SP); e Santa Cruz, em Américo Brasiliense (SP).   
Solenidade no Palácio do Planalto: 169 usinas foram certificadas (Foto: Roberto Stuckert Filho/PR) 

O MPT pede ainda a cassação do selo e o impedimento de atribuição de nova certificação antes da análise prévia do conteúdo de fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e de processos na Justiça de Trabalho, sob pena de pagamento de multas diárias de R$ 50 mil.

As ações baseiam-se em uma ampla gama de irregularidades, tanto relacionados à forma quanto ao conteúdo: desde a realização de auditorias antes do estabelecimento das regras para a atribuição do "selo social" (sem que fossem seguidos procedimentos mínimos, avaliações dos relatórios formatados pelas consultorias credenciadas e consultas a possíveis denúncias, autuações e pendências judiciais trabalhistas, entre outras lacunas) até a ocorrência de flagrantes violações de normas (como a "validação" de informações não checadas fornecidas pelas próprias usinas que, em alguns casos, incluiu até a "conversão" de dados falsos como reais, a falta de comprovação da composição da equipe de averiguação, bem como o deliberado descaso quanto à participação obrigatória de sindicatos de trabalhadores e também quanto à consulta de médicos de trabalho responsáveis pelos empreendimentos).
Mesmo algumas premissas fundamentais do "Compromisso Nacional para a Melhoria das Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar" - acordo tripartite que está na base da concessão do selo -, como a contratação direta de mão de obra rural por parte das usinas signatárias, não vêm sendo cumpridas. Foi constatado pelo procurador Rafael que houve "aprovação" por parte de auditoria privada contratada até quando restou comprovada a contratação indireta (pela empresa rural associada, e não pela usina). Tal conduta de atestar algo irreal como verdadeiro, que envolveu a filial brasileira da renomada consultoria internacional Ernst & Young Terco e a Usina São José da Estiva mereceu a classificação taxativa de "falsidade ideológica" (confira quadro abaixo).
"O selo do setor da cana parece fazer parte de uma estratégia política de negar a existência de problemas trabalhistas em setores considerados sensíveis", declara o procurador Rafael. Além do compromisso e do selo do setor da cana-de-açúcar, foi lançado um acordo na área da construção civil (que também deve ter um selo), que poderá ser seguido por outro relativo à confecção civil. "Aparentemente", complementa, "qualquer setor econômico importante no qual os órgãos de fiscalização [do poder público] tenham flagrado casos de trabalho análogo à escravidão tem [sido envolvido em] um movimento contrário [liderado] por parte do próprio governo federal no sentido de negar, contrariamente aos fatos, a existência de qualquer problema".
Em vez de atestar quadros de "conformidade" que supostamente garantiriam benefícios, a certificação tende a trazer, na visão do membro do MPT que apresentou as ações civis públicas, prejuízos aos trabalhadores. Tais prejuízos, sustenta Rafael, podem decorrer de diversas formas: desde a ocultação de problemas trabalhistas e a ilusão de "regularidade" firmada dentro e fora do país até o desencorajamento do pleito individual contra usinas "compromissadas", assim como a perda de apoio (social e político) à mobilização coletiva da classe trabalhadora em prol da garantia de direitos. 
Comissão
Nacional 
Usina e Auditoria
Irregularidades apontadas* -
Ministério Público do Trabalho
Posições** 
Selo
Concedido 
Santa Fé,
KPMG 
Respostas absolutamente idênticas ao questionário de uma outra usina - Ipiranga, em Descalvado (SP) -, denotando indício de "precariedade" da auditoria. Mobilização de apenas um técnico, em descumprimento à exigência de ao menos dois profissionais. Não há data da inspeção e nem entrevista com médico do trabalho   A usina não deu retorno. A KPMG afirma que produziu relatórios de acordo com as normas definidas
Selo Concedido
São José da Estiva,
Ernest & Young Terco 
"Aprovação" de terceirização como se fosse contratação direta, prática classificada como "falsidade ideológica". Ausência de identificação dos dois profissionais (devidamente qualificados) requeridos para a execução da auditoria. Admissão de que não houve checagem das informações dadas pela empresa Não houve manifestação nem por parte da usina e nem da parte da auditoria internacional
*Seleção de apenas alguns dos inúmeros itens ilegais e controversos destacados nas ações civis públicas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT)**A Secretaria-Geral (SG/PR) não atendeu ao contato da reportagem
Discursos e ações
Realizada em espaço nobre do Palácio do Planalto em junho deste ano, a solenidade de entrega dos 169 selos de "empresa compromissada" foi brindada com um discurso presidencial no qual Dilma Rousseff confirmou louvações à produção do etanol a partir da cana, dando seguimento a posições que vinham sendo defendidas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A chefe do Executivo comemorou a expressiva proporção de matrizes energéticas renováveis obtida pelo país, fazendo referência ao contexto da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), no sentido de "produzir energia limpa, respeitando o meio ambiente e a legislação social".  Na sua fala, Dilma louvou especialmente a estratégia governamental de "resposta" a duas acusações centrais que pairavam sobre a expansão da monocultura canavieira: o incentivo ao desmatamento de matas nativas (em especial, da Floresta Amazônica), com o Zoneamento Agroecológico (ZAE) da Cana-de-Açúcar, e a exploração de trabalhadoras e trabalhadores em condições análogas à escravidão, com o já citado Compromisso Nacional.

Cortador avança em canavial. 
Fotos: Iberê Thenório/Arquivo Repórter Brasil
"Hoje, nós estamos aqui mostrando que a área que produz este combustível, que é (...) renovável, toda a produção sucroalcooleira do Brasil e, sobretudo, a base da produção do etanol, ela é uma das áreas que têm das melhores práticas na relação com os processos de trabalho, com a jornada de trabalho, com a condição de respeito ao direito do trabalhador nesta área", afirmou Dilma aos satisfeitos usineiros presentes. Ex-ministro na gestão de Fernando Henrique Cardoso e presidente do Conselho Deliberativo da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Pedro Parente disse que o reconhecimento de "boas práticas" por meio do selo contribui para "derrubar mitos que circulavam há muito tempo sobre esse setor". Para o executivo, que está à frente da gigante do agronegócio Bunge no Brasil, "a generalização que se observava em relação às relações trabalhistas do setor sucroenergético não era apenas improcedente, mas complemente injusta com a imensa maioria dos empresários". 
Dados reunidos pelo procurador Rafael para dar sustentação às sete ações revelam um panorama que vai de encontro às sentenças palacianas e patronais. Apenas no interior paulista sob a alçada da Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região (PRT-15), que engloba a área de Araraquara (SP), existiam (em agosto de 2011) 149 procedimentos - 43 ações, dos mais diversos gêneros, e 106 inquéritos e outras investigações - em trâmite relacionados a empresas do setor sucroalcooleiro que já aderiram ao "Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar".
No bojo das 43 ações judiciais trabalhistas em curso, 22 são recentes, tendo sido propostas em 2010 ou 2011, isto é, foram apresentadas mais de um semestre após o lançamento do acordo, em junho de 2009. De acordo com o procurador Rafael, as referidas ações e procedimentos relacionam-se a violações trabalhistas graves: "ilícitos relacionados a meio ambiente do trabalho, não fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPIs), não disponibilização de sanitários, alojamentos precários, excesso de jornada, acidentes fatais, fraudes trabalhistas, não pagamento de salários, assédio moral etc.". Houve inclusive condenações recentes na Justiça do Trabalho, com a imposição de indenizações milionárias a usinas por danos coletivos causados.

Recomendações e representaçõesSegundo o autor das ações civis públicas, a primeira circunstância que gerou a suspeita de irregularidades foi o fato de que uma usina que havia sido flagrada com trabalho escravo contemporâneo por uma comitiva da qual o próprio Rafael consta do rol das primeiras 169 agraciadas com o selo de "empresa compromissada". Após quitar verbas rescisórias de dezenas de trabalhadores resgatados e ter sido levada a pagar altos valores por dano coletivo, a empresa foi, mediante o descumprimento de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e a consequente perplexidade manifestada pelo procurador do trabalho, apresentada à sociedade como "empregador-modelo".
Para averiguar as condições concretas em que os selos foram atribuídos, o representante do MPT solicitou a cópia de todos os processos para a Secretária-Geral da Presidência da República (SG/PR), que gerencia o acordo. A partir da análise da documentação referente às usinas fixadas na sua área de atuação, decidiu entrar com os pedidos de cassação dos selos. Ele remeteu ainda cópias dos relatórios de auditoria e demais documentos às Procuradorias Regionais (em São Paulo e em outros Estados) nas quais há usinas agraciadas com o selo, de modo que outras ações poderão ser propostas conforme a iniciativa de cada pessoa dedicada às respectivas jurisdições do MPT.

Ônibus que transporta cortadores em usina
Um dos problemas ressaltados nas ações diz respeito ao caráter indevido da criação de um selo trabalhista pela União, que bate de frente com a já ratificada Convenção 81 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) - referente à manutenção e estruturação da atividade de inspeção do trabalho (que, no caso do Brasil, é atribuição do MTE), não sendo autorizada a criação de outros mecanismos, sem qualquer autorização legislativa, que comprometam a atividade prevista. Para esse tipo de certificação de caráter trabalhista, as usinas poderiam perfeitamente recorrer a iniciativas privadas já existentes como a SA (Social Accountabilty) 8000 ou o selo da Bonsucro (parte do esforço transnacional Better Sugar Initiative), que não suscitam qualquer tipo de incompatibilidade com a fiscalização estatal brasileira.
Outros dois pontos de polêmica consistem na completa inexistência de processo administrativo para a concessão dos selos, que se limitaram unicamente aos relatórios das auditorias contratadas e pré-agendadas pelas próprias usinas, e na desconsideração dos passivos (que poderiam ser apontados por meio da consulta ao MTE, ao MPT e à Justiça Trabalhista) e das denúncias de organizações da sociedade civil, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT). O primeiro deslize posiciona o procedimento completamente à margem do controle público, infringindo a Lei  n° 9.784/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Ambos confirmam, no entendimento do procurador Rafael, que a atribuição do selo é "`um jogo de cartas marcadas`, concebido para dar um `verniz` de credibilidade a uma decisão, supõe-se que política já que certamente não é técnica, de conceder o Selo às empresas do setor, mesmo que contrariamente à realidade". 
 
Entrevistas de trabalhadores com a presença da parte do empregador, funcionários de usinas (e não técnicos auditores) a cargo das chamadas de lideranças sindicais (que só estiveram presentes em cerca de 50% das auditorias feitas em São Paulo), e a realização de auditorias durante a entressafra completam o cenário pintado pelo MPT. O controverso panorama joga mais lenha, aliás, na fogueira da existência de um clima de "cabresto político na inspeção do trabalho" voltado para a "tentativa de defender o empregador a qualquer preço" - denunciada pela ex-secretária da área no MTE, Vera Lúcia Albuquerque, que pediu exoneração há pouco mais de duas semanas. Episódios da etapa final da I Conferência Nacional do Emprego e Trabalho Decente (CNTED) também reforçam a mesma linha da supremacia patronal.

Posicionamentos
Desde que foi lançado, em junho de 2009, o "Compromisso Nacional para o Aperfeiçoamento das Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar" vem sendo foco de polêmicas, seja quanto à ausência de itens básicos (prevê a marmita, mas exclui a alimentação) em seu escopo, seja quanto à adesão inicial de três empresas que constavam da "lista suja" do trabalho escravo.

Componentes da Comissão Nacional de Diálogo e Avaliação do Compromisso Nacional, dedicada à coordenação das ações relativas ao mecanismo - incluindo, obviamente, a atribuição do selo -, foram contactados pela Repórter Brasil para apresentar seus posicionamentos acerca do pedido de anulação das certificações. Principal articuladora do selo, a Secretaria-Geral da Presidência da República não respondeu ao contato feito pela reportagem.


Cortador em lavoura de cana. 
A Unica informou que não divulgará a sua posição até que todas as ações sejam apreciadas pela Justiça do Trabalho. A Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo (Feraesp), que também faz parte do colegiado, não respondeu à reportagem. Apesar das críticas que tem feito a aspectos do processo, a Feraesp e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), que representam os trabalhadores, estiveram presente na cerimônia que concedeu o selo às 169 usinas.

De todas as sete usinas acionadas pela reportagem, apenas a Usina Irmãos Malosso e o grupo Raízen se posicionaram. Em nome da primeira, Roberto Zanardi afirmou que a empresa ainda não havia sido notificada e que, portanto, desconhecia o teor da ação. A assessoria de imprensa da Raízen também sustentou que a companhia ainda não tinha sido notificada, mas adicionou que o selo de "empresa compromissada" é "mais uma entre diversas iniciativas de aprimoramento de práticas no setor sucroalcooleiro". O mesmo representante salientou ainda que "não pretende interferir com a atuação das autoridades competentes, mas sim incentivar a indústria como um todo a promover a adoção de melhores práticas trabalhistas no setor".A KMPG e a Ernst & Young Terco também foram consultadas sobre irregularidades identificadas pelas ações do MPT. A KPMG se limitou a afirmar que produziu relatórios de verificação "de acordo com as indicações e normas estabelecidas no Edital de Chamada Pública n° 01/2011 – SG/PR", publicado em julho de 2011 e que "como sempre, está disponível às autoridades para prestar eventuais esclarecimentos que sejam solicitados". Não houve retorno da parte Ernst & Young Terco Auditores Independentes S/S.
Das sete ações civis públicas, três juízes de 1ª instância, até o momento, decidiram não ser a questão de suas competências e remeteram os processos para a Justiça Federal. Em três outros casos, houve designação de audiência para ouvir os réus. A sétima ação ainda não foi apreciada. No que diz respeito aos três casos em que a Justiça do Trabalho não acolheu as ações, o MPT já recorrera de dois e ainda não tinha sido intimado do terceiro.
Quanto às empresas de auditoria, o representante do MPT anunciou que enviará uma representação ao Conselho Regional de Contabilidade de São Paulo (CRP/SP) com relato das irregularidades detectadas. No que toca à indicação de falsidade ideológica, o procurador do trabalho confirmou que pretende representar criminalmente junto ao Ministério Público Federal (MPF).

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Lideranças do agreste reúnem-se em Campina Grande em preparação ao EPA

darcylima/spmne

O Fórum de Lideranças do Agreste (FOLIA) realizou no último dia 19.10 sua reunião ordinária na cidade de Campina Grande, neste dia a reunião teve como objetivos: discutir sobre o tema Território e Territorialidade Camponesa e Preparar e escolher os representantes do Fórum para participação no VI Encontro Paraibano de Agroecologia (EPA), aproximadamente 40 pessoas participaram da atividade.

darcylima/spmne
O período da manhã foi dedicado ao estudo do tema: “Território e Territorialidade Camponesa” que teve como facilitador o professor Alexandre Nogueira, docente da Universidade Estadual da Paraíba, ele fez um resgate histórico social da questão territorial no Brasil e especialmente na Paraíba, abordou também aspectos das formas de produção da sociedade e sua forma de apropriação da terra. Com uma linguagem simples, direta e engajada o professor Alexandre Nogueira motivou os atores sociais presentes a resistirem na batalha diária de construção de alternatividades de permanência, com dignidade, dos camponeses no campo.

darcylima/spmne
Após a apresentação todos foram convidados a trabalharem em grupo para responderem a duas perguntas: A) Quais as experiências de resistência e convivência com o semiárido? B) Que território estamos construindo com o FOLIA? E em seguida foi realizada um plenária abordando as duas perguntas norteadoras.  A tarde foi discutido sobre a participação dos membros do FOLIA no sexto EPA que tem como tema: “É no semiárido que a vida pulsa; É no semiárido que o povo resiste” que acontecerá no período de 24 a 26 de outubro na cidade de Lagoa Seca.

veja mais imagens, aqui

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A espetacularização e a ideologização do Judiciário


Leonardo Boff*


Para não me aborrecer com e-mails rancorosos vou logo dizendo que não estou defendendo a corrupção de políticos do PT e da base aliada, objeto da Ação Penal 470 sob julgamento no STF. Se malfeitos forem comprovados, eles merecem as penas cominadas pelo Código Penal. O rigor da lei se aplica a todos.

Outra coisa, entretanto, é a espetacularização do julgamento transmitido pela TV. Aí é ineludível a feira das vaidades, o vezo ideológico que perpassa sobre a maioria dos discursos.

Desde A Ideologia Alemã de Marx/Engels (1846) até Conhecimento e Interesse de J. Habermas (1968 e 1973) sabemos que por detrás de todo conhecimento e de toda prática humana age uma ideologia latente. Resumidamente podemos dizer que a ideologia é o discurso do interesse. E todo conhecimento, mesmo o pretende ser o mais objetivo possível, vem impregnado de interesses. Pois assim é a condição humana. A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. E todo o ponto de vista é a vista de um ponto. Isso é inescapável. Cabe analisar politica e eticamente o tipo de interesse, a quem beneficia e a que grupos serve e que projeto de Brasil tem em mente. Como entra o povo nisso tudo? Ele continua invisível e até desprezível?

A ideologia pertence ao mundo do escondido e do implícito. Mas há vários métodos que foram desenvolvidos, coisa que exercitei anos a fio com meus alunos de epistemologia em Petrópolis, para desmascarar a ideologia. O mais simples e direto é observar a adjetivação ou a qualificação que se aplica aos conceitos básicos do discurso, especialmente, das condenações.

Em alguns discursos como os do ministro Celso de Mello o ideológico é gritante, até no tom da voz utilizada. Cito apenas algumas qualificações ouvidas no plenário: o “mensalão” seria “um projeto ideológico-partidário de inspiração patrimonialista”, um “assalto criminoso à administração pública”, “uma quadrilha de ladrões de beira de estrada” e um “bando criminoso”. Tem-se a impressão que as lideranças do PT e até ministros não faziam outra coisa que arquitetar roubos e aliciamento de deputados, em vez de se ocupar com os problemas de um país tão complexo como o Brasil.

Qual o interesse, escondido por detrás de doutas argumentações jurídicas? Como já foi apontado por analistas renomados do calibre de Wanderley Guilherme dos Santos, revela-se aí certo preconceito contra políticos vindos do campo popular. Mais ainda: visa-se aniquilar toda a possível credibilidade do PT, como partido que vem de fora da tradição elitista de nossa política; procura-se indiretamente atingir seu líder carismático maior, Lula, sobrevivente da grande tribulação do povo brasileiro e o primeiro presidente operário, com uma inteligência assombrosa e habilidade política inegável.

A ideologia que perpassa os principais pronunciamentos dos ministros do STF parece eco da voz dos outros, da grande imprensa empresarial que nunca aceitou que Lula chegasse ao Planalto. Seu destino e condenação é a Planície. No Planalto poderia penetrar como faxineiro e limpador dos banheiros, como aliás parece ter sido o primeiro trabalho do ministro Joaquim Barbosa no STE. Mas nunca como presidente.

Ouve-se no plenário ecos vindos da Casa Grande que gostaria de manter a Senzala sempre submissa e silenciosa. Dificilmente se tolera que através do PT os lascados e invisíveis começaram a discutir política e sonhar com a reinvenção de um Brasil diferente. Tolera-se um pobre ignorante e mantido politicamente na ignorância. Tem-se verdadeiro pavor de um pobre que pensa e que fala. Pois Lula e outros líderes populares ou convertidos à causa popular, como João Pedro Stedile, começaram a falar e a implementar políticas sociais que permitiram uma Argentina inteira ser inserida na sociedade dos cidadãos.

Essa causa não pode estar sob juízo. Ela representa o sonho maior dos que foram sempre destituídos. A Justiça precisa tomar a sério esse anseio a preço de se desmoralizar, consagrando um status quo que nos faz passar internacionalmente vergonha. Justiça é sempre a justa medida, o equilíbrio entre o mais e o menos, a virtude que perpassa todas as virtudes (“a luminossísima estrela matutina” de Aristóteles). Estimo que o STF não conseguiu manter a justa medida. Ele deve honrar essa justiça-mor que encerra todas as virtudes da polis, da sociedade organizada. Então, sim, se fará justiça neste país.


*Leonardo Boff é professor aposentado de Ética da UERJ


fonte: brasildefato

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

SPM encaminha denúncia de situação degradante de trabalho, com migrantes, em Guaranésia-MG


AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - PASSOS-MG
Prezados procuradores,
sou José Carlos Alves Pereira - Colegiada Executiva do Serviço Pastoral dos Migrantes - SPM
 
Ontem, à noite (01 de Outubro/2012), o trabalhador Andreciano me telefonou relatando sobre as condições degradantes de trabalho e alojamento em que eles foram submetidos na Destilaria Alvorada do Bebedouro, localizada no município de Guranésia-MG.

De acordo com o relato de Andreciano, eles formam um grupo de 200 trabalhadores e estão submetidos à seguinte situação:
·  a empresa desconta o FGTS deles, mas não repassa ou deposita na receita ou Caixa Federal
·  Pagamento por produtividade e salários de diárias muito abaixo do padrão salarial para sua categoria profissional
·  Alojamentos inseguros, insalubres e precários
·  não acerto de contas com os trabalhadores, para que eles possam retornar à sua região de origem, no caso, o Vale do Jequitinhonha-MG
·  Impedimento dos trabalhadores, através do não acerto de contas, de retornar à sua região de origem.

Diante disso os trabalhadores organizaram uma greve que já dura 4 dias, sendo que há dois dias foram suspensas suas refeições básicas (café, almoço e janta)
 
Solicitamos ao Ministério Público Federal de Varginha que interceda pelos direitos desses trabalhadores tomando as atitudes jurídicas necessárias sobre a empresa infratora. 
O telefone do SPM é: (11) 2063-7064
O meu cel é (11) 98565-7709
 
Aguardamos o seu retorno para confirmar o recebimento e acolhida desta denúncia e contamos com sua imediata intervenção sobre o processo de violação de direitos trabalhistas a que nos referimos.
Att.
José Carlos Alves Pereira
Pela Colegiada Executiva do Serviço Pastoral dos Migrantes  SPM

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Nota de repúdio contra mais uma violência sexista no Estado da Paraíba


Nós, que integramos as Organizações e Movimentos Sociais da Paraíba, cientes que uma vida sem violência é um direitos das mulheres e de toda a sociedade, expressamos nossa indignação com mais um caso de violência contra mulher ocorrida no município de Queimadas.

A adolescente Ana Alice de 16 anos filha da líder sindical Angineide - diretora do Sindicato dos/das Trabalhadores/as Rurais de Queimadas e também participante ativa do Pólo Sindical da Borborema, desapareceu na última quarta dia 19 de setembro uma semana após visita da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência contra as Mulheres à Paraíba com o objetivo de debater situações de violência contra a mulher, realizar a apuração de denúncias de omissão do poder público diante do problema e a aplicação da Lei Maria da Penha.

A CPMI constatou entre outras coisas: falta de um plano específico de segurança pública para a prevenção e o enfrentamento dos homicídios contra mulheres; falta de delegacias especializadas para o atendimento as mulheres vítimas de violência.

Neste sentido queremos denunciar que mais uma adolescente provavelmente vitima da violência contra a mulher no município de Queimadas Estado da Paraíba, encontra-se desaparecida e exigir das autoridades competentes a apuração dos fatos e o fim da impunidade.

Reiterarmos a nossa indignação com o machista e sexista que a exemplo do estupro coletivo de cinco mulheres, sendo duas delas, assassinadas brutalmente por dez homens durante uma festa realizada por eles com o intuito de “presentear” o aniversariante com o estupro dessas mulheres no mesmo município de Ana Alice, Queimadas.

Nesta ocasião afirmamos e reiteramos que o não cumprimento por parte do Estado no que tange a pauta de reivindicações do movimento feminista poderá ser motivo de outras tantas violências contra as mulheres e destacar a urgência imediata das seguintes providências entre outras propostas pelo movimento:

- Que o orçamento público destinado à Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres assim como aos programas e serviços relacionadas ao enfrentamento à violência contra a mulher seja ampliado de forma a possibilitar aos serviços da rede de enfrentamento o seu funcionamento efetivo;

- A ampliação do número de delegacias especializadas no atendimento às mulheres-DEAMs, pois só existem 9 no Estado (que tem 223 municípios) assim como as condições estruturais e de recursos humanos que devem possibilitar o funcionamento desses serviços;

- Aumento do número de Centros de Referência de atendimento às mulheres vítimas de violência, pois no Estado só existem 4 e não funcionam adequadamente porque a demanda é muito grande e esse número não garante o atendimento de todas as mulheres que procuram o serviço como também não garante a qualidade dos atendimentos.;

- Ampliação do número de casas abrigo que atendem às mulheres vítimas de violência, pois só existe uma no Estado e também não funciona com boas condições, é necessário ampliar a equipe multiprofissional e possibilitar as condições de trabalho para que a equipe possa atender às mulheres com qualidade;

- Ampliação do número de varas e juizados especializados ao enfrentamento da violência doméstica, existe 1 vara e 1 juizado no Estado, número insuficiente para dar andamento aos processos com eficiência.

Pelo fim da impunidade e da violência contra as mulheres!

Nº de organizações que apóiam

1-    Centro de Ação Cultural – CENTRAC
2-    Coletivo de Estadual de Mulheres do Campo e da Cidade
3-    Associação das Trabalhadoras Domésticas de Campina Grande
4-    Centro de Educação e Organização Popular – CEOP – Picuí
5-    Associação de Desenvolvimento Comunitário de Serra Baixa – Picuí
6-    Cooperativa de Trabalho Múltiplo e Apoio as Organizações de Auto Promoção – Campina Grande.
7-    Polo Sindical e das Organizações da Agricultura Familiar da Borborema
8-    Associação dos Apicultores do Sertão Paraibano
9-    Centro de Educação Popular e Formação Social – CEPFS – Teixeira
10-  Central das Associações dos Assentamentos do Alto Sertão Paraibano – CAAASP
11- PATAC – Campina Grande
12- AS-PTA – Agricultura Familiar  e Agroecologia – Esperança – PB
13- CPT – Comissão Pastoral da Terra - Campina Grande
14- -STR- Fagundes
15- STR – Gado Bravo
16- STR – Barra de Santana
17- Cáritas Brasileira – Regional NE II
18-  Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM
19-  Serviço Pastoral dos Migrantes do Nordeste – SPM NE