Essas parecem ser as principais credenciais para que o deputado federal, Eduardo Bolsonaro,
seja indicado para assumir a função de Embaixador do Brasil em Washington. Filho do Messias
e amigo do filho do tio Sam. Filho do capitão, no Brasil, e amigo do filho do Magnata, nos
Estados Unidos. Ah sim, não podemos esquecer. O candidato domina com desenvoltura o
inglês. Navega como um peixe pelas águas bravias das redes sociais. Declara-se evangélico.
Conhece como ninguém a linguagem truculenta da ofensa, da intriga, do combate, do
xingamento. Depois, de forma um tanto quanto esdrúxula e paradoxal, reúne a incrível
versatilidade de participar, contemporaneamente, da bancada da Bíblia e da bancada da bala...
Melhor que isso, só encomendando!
Pergunta: qual a reação do Senado diante dessa indicação no mínimo suspeita? Qual o teor da
sabatina que costuma fazer parte do ritual? Como serão avaliadas semelhantes credenciais, seja
quanto ao oportunismo de marca nepotista, seja quanto ao caráter amigável e “terrivelmente
diplomático” do deputado? A menos que tenha mudando as características de um embaixador.
Pelo que me consta, ele deve antes de tudo primar pela capacidade do diálogo e da escuta. Ou
então, para citar Paulo Freire, um autor que certamente deixa furiosos os Bolsonaros, um
embaixador deve desenvolver uma relação predominantemente “dialógica”.
Constrangimento no Senado e em seus representantes? Talvez sim, talvez não. Depende do grau
de colonização que o clã Bolsonaro conseguiu imprimir sobre cada uma de “Suas Excelências”.
Há indicadores de que esta casa do Congresso Nacional, diferentemente da Câmara federal, se
comporta de forma mais dócil diante das investidas do Executivo. Seja como for, sempre pode
acabar por prevalecer o jeitinho brasileiro. Tudo se move e tudo se ajeita, desde que a Casa
Grande & Senzala sigam, respectivamente, uma com seus privilégios, a outra com os favores. A
diferença está em que, enquanto os primeiros são pétreos e intocáveis, os segundas dependem
do humor de cada capitão em exercício.
Paira no ar um formidável espanto: então é isso o que chamam de “nova política”! Torna-se
necessário pedir socorro a alguns pilares da formação política brasileira, tais como Caio Prado
Junior, Celso Furtado, Raymundo Faoro, Gilberto Freire – uma vez mais, nomes indigestos aos
Bolsonaros. Contentemo-nos com aquele que mais recentemente nos deixou, aos 85 anos, o
sociólogo pernambucano Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, mais conhecido por Chico de
Oliveira. Por longos 30 anos exerceu o cargo de professor titular da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências da Universidade de São Paulo.
“Em O Ornitorrinco, ensaio recente mais famoso, recorreu ao estranho animal dotado de bico
de pato – considerado ao mesmo tempo réptil, pássaro e mamífero – como metáfora do Brasil
enquanto nação presa a um impasse evolutivo, que passeia entre o arcaico e o mais moderno,
entre a extrema miséria e o luxo ostensivo. Chico de Oliveira dizia que o conceito de revolução
estava ultrapassado e que o futuro residia na esquerda reformista” (Revista Época, Ed. Globo, nº
1097, 15.07.2019, pág. 42). Deve ter tomado um susto ao tropeçar com a extrema direita e sua
insistência em trazer de volta práticas execradas da “velha política” dos tempos do coronelismo,
a qual governa para os amigos e os amigos dos amigos.
Pe. Alfredeo J. Gonçalces, cs – Rio de Janeiro, 12 de julho de 2019
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