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domingo, 15 de abril de 2018

Caravana visita comunidades ribeirinhas de 4 municípios por onde passa o canal da Transposição na Paraíba

GT de Comunicação ASA PB


Nesta quarta-feira (11), a programação da Caravana das Águas e da Agroecologia consistiu em cinco visitas nos municípios paraibanos de Camalaú, Monteiro, Caraúbas e São Domingos do Cariri, por onde passa o canal da Transposição do Rio São Francisco. As visitas dialogam com um dos principais objetivos do evento que é o de conhecer e compreender a realidade das populações, que de alguma forma, são afetados pela obra, incomparavelmente a maior política pública na área de recursos hídricos do estado.

A caravana é uma iniciativa da Articulação do Semiárido Paraibano – ASA Paraíba em parceria com outros movimentos sociais do campo e acontece no Centro de Desenvolvimento do Semiárido do Campus Sumé da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, no Cariri Paraibano. Em seu segundo dia, os participantes se dividiram em cinco grupos para as seguintes visitas:

Camalaú
No município de Camalaú, a Caravana visitou as comunidades Mocó, Baraúnas, Viegas, Assentamento Novo Mundo e a associação da colônia dos pescadores. Na ocasião, os moradores da região contaram um pouco de como receberam as águas da Transposição, os desafios que estão enfrentando e os impactos dessa obra. Na comunidade de Mocó, os moradores falaram sobre o sentimento de realização de um sonho até então desacreditado e de sua gratidão por isso. Surgiram ainda relatos sobre os efeitos negativos da obra, principalmente com relação a limitação da área de produção (que é de meio hectare) e o isolamento das comunidades uma vez que não foram construídas as pontes de acesso.

Na comunidade de Viegas os visitantes identificaram uma grande problemática relacionada ao rasgo do açude de Camalaú, para levar água para Boqueirão, o que tem impossibilitado a acumulação da água no reservatório do município e, consequentemente, prejudicando a agricultura familiar, as atividades de pesca, entre outras. Nessa comunidade também foi verificada a existência de uma experiência de recuperação da mata ciliar em um pequeno trecho do Rio Paraíba Norte, através de técnicas do barramento do solo e sistema agroflorestal.  Os caravaneiros perceberam a partir dessas vivências, que existe uma ausência de conhecimento das comunidades em relação aos aspectos de regulamentação da obra, seus impactos ambientais e na vida das comunidades, como também uma preocupação com relação ao acesso a água e sua permanência no local.

Caraúbas
A caravana das águas também passou pelo município de Caraúbas. A primeira parada, foi no Rio Paraíba, onde foram encontrados desafios como fato de o esgoto e o lixo da cidade serem despejados direto para o Rio Paraíba. A segunda parada foi na propriedade dos irmãos agricultores João e José Galdino, localizada a 50 metros do Rio Paraíba, que dizem já sentir os impactos da transposição. “A água chegou e trouxe uma série de dúvidas e preocupação para a gente, que está sem saber se pode plantar a 50 metros, se vai pagar a água ou se não vai. Hoje eu já tenho o plantio de bananeiras, só que se passar de meio hectare, posso receber multa. E o que vamos fazer com o restante da terra? O que parece é que eles querem que a gente saia da terra nossa terra”, contou José. A última parada da caravana foi para conhecer as experiências agroecológicas da família de José Carlos e Josefa Brito. Há 10 anos o casal escolheu a convivência com o semiárido, mesmo vivendo num região de solo pedregoso. Com a cisterna do tipo enxurrada, o casal aumentou e diversificou a produção animal e vegetal, fazem estratégia de recuperação do uso e manejo do solo, reutilizam a água, cultivam mudas e comercializam a produção.

Monteiro
As famílias do Assentamento Xique-xique localizado na cidade de Monteiro-PB receberam um grupo de visitante formada por agricultores e agricultoras, técnicos e estudantes, para entenderem como essa população assentada da reforma agrária está vivendo a partir da chegada das águas do Rio São Francisco. Na propriedade de 3.000 hectares vivem 40 famílias. 

Cada lote foi dividido para maioria da seguinte maneira: 5 hectares na agrovila, 17 hectares para cada família e mais meio hectare as margens do Rio Paraíba que recebe as águas da transposição. Segundo os agricultores que vivem na propriedade há oito anos, os desafios são constantes mesmo com a chegada das chuvas. Eles destacaram a falta de assistência técnica, o risco de perdas da fauna e flora nativa, a ausência de financiamento para a construção das casas e a fragilidade da organização coletiva como seus principais desafios. Para as famílias, aproveitar melhor água e construir suas casas, são sonhos mais almejados por todos.

Ainda em Monteiro, um segundo grupo visitou a Vila Produtiva Rural (VPR) Lafayette e a comunidade Pau D’arco. Agricultoras e agricultores contaram como estavam avançando nas práticas de convivência com o Semiárido antes do projeto da transposição chegar, onde estavam desenvolvendo seus sistemas produtivos e gerando renda familiar. Essas famílias denunciam que foram mobilizadas de forma arbitrária, com ameaças e sem direito a acordos, sendo obrigadas a abandonar suas casas e a recomeçar, com a proposta de assistência que não se concretizou após as obras começarem.


Os depoimentos trazem a dor e a falta de esperança para quem tinha uma vida consolidada e agora precisa recomeçar do zero. Muitas famílias relatam que a promessa de água não foi cumprida e que pouco se fez para assistência a elas, deixando assim a marca da falta de planejamento e descaso do Ministério e da empresa responsável pela obra. O presidente da Associação de Lafayatte, denuncia que o Rio Paraíba hoje encontra-se sufocado pelos entulhos das obras que não foram retirados. As famílias ribeirinhas estão a 100 metros do canal da transposição e não tem permissão de pegar água do rio. Elas hoje são abastecidas por carros pipas, mas dizem que a água é de péssima qualidade e, ainda assim, só veio como conquista depois que a associação moveu um processo jurídico exigindo que as casas fossem abastecidas.

São Domingos do Cariri


O grupo que visitou a zona rural de São Domingos conheceu três comunidades: Pau Ferro, Lajedo e Melo II. Lá, as comunidades vivem um drama que é antigo, o isolamento causado com a cheia do Rio Paraíba que impede o acesso à zona rural de crianças que precisam chegar às escolas, o transporte de mercadorias e o livre trânsito das pessoas, que ficam sujeitas ao risco de serem levados pela correnteza. Com a chegada da Transposição, o problema que só durava dois ou três meses por ano agora é permanente. Outro grande desafio encontrado é o plantio de monoculturas à base de agrotóxicos a apenas alguns metros do rio, com um alto risco de contaminação, além de contrariar a determinação da Agência Executiva de Gestão das Águas no Estado da Paraíba (Aesa). O Joelson Gonçalves conta que anda aflito com a limitação de meio hectare para a sua produção de bananas que hoje ocupa 1,5 hectare. “Assinei o termo me comprometendo a não usar a água, mas disse ao fiscal que ele iria tirar o pão da boca dos meus dois filhos. Estou sem dormir direito, por causa disso”, diz o agricultor que retira a sua renda do bananal há cerca de 10 anos. Ele ainda afirma que não usa agrotóxicos, mas que a fiscalização não cobra das plantações de pimentão que usam pesticidas ao lado de sua propriedade.

Ao final de todas as visitas, cada grupo se reuniu para avaliar o que viu e ouviu e organizar uma síntese para compartilhar com os demais participantes da caravana, no dia seguinte.

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