Imagem retirada da internet |
D. Demétrio Valentini
O pior é que o muro permanece não
só na retina, mas na realidade. Tão fácil este muro não vai cair. Assim como
muitos outros muros vão continuar existindo. Alguns parecem ter a vocação da
muralha da China. Vão se integrar na própria realidade, como se fizessem parte
natural dela.
Então fica a questão, nada
irrelevante. Como conviver com os muros. Pois precisamos aprender a
contorná-los, como o rio contorna a montanha.
Os muros não conseguem deter a
vida, que não se limita a fronteiras abertas para o comércio e para a livre
circulação de pessoas. A vida tem outros valores. Quando obstaculizados,
parecem crescer e se firmar de maneira surpreendente.
Não precisamos esperar que os
muros desapareçam, para despertar em nós energias novas e valores
insuspeitados. A vocação humana continua nos desafiando para a convivência
fraterna neste pequeno planeta que nos aponta para a infinitude do universo.
Um padre que há muito tempo
trabalha nas proximidades da fronteira do México com os Estados Unidos, passou
a enxergar o muro de maneira diferente. Sem o muro, milhões de mexicanos, com
certeza, passariam para o outro lado. Mas quem disse que não é possível ficar
no México, e fazer daquele país um lugar onde se pode viver com alegria e desenvolver as esplêndidas
potencialidades deste país, tão abençoado por Deus, apesar de tão próximo aos
Estados Unidos!
Isto é, os muros podem inverter
seu sinal, e despertar para desafios salutares e providenciais, como o
fortalecimento da identidade própria de cada país, e a valorização de suas
características humanas e culturais. Verdade é que não precisamos construir
muros para isto. Mas se eles foram construídos, vamos tirar deles o proveito
que podem nos proporcionar.
Mas o muro suscitou em Tijuana
uma realidade comovente, patrocinada pelos padres e irmãs da Congregação de São
Carlos. Foram fundados pelo bispo italiano D. João Batista Scalabrini, com a
finalidade específica de acompanhar e apoiar os migrantes. Naquele tempo eram
migrantes que demandavam aos milhares da Europa para o continente americano.
Agora, esses padres e irmãs se dedicam a acompanhar as novas ondas migratórias,
que inverteram as rotas antigas, e demandam em direção à Europa e aos Estados
Unidos.
Pois bem, eles intuíram que
Tijuana era um ponto estratégico para a sua benemérita missão. Construíram duas
casas de acolhida, uma para mulheres, assumida pelas Irmãs, e outra para
homens, assumida pelos Padres. Diariamente, cada casa acolhe em média 120
migrantes, procedentes em sua maioria dos deportados, que os Estados Unidos se
encarregam de despejar em território mexicano, centenas por dia.
O que impressiona é o contraste
que os migrantes experimentam. Despejados com frieza são acolhidos com muito
respeito pelos padres e irmãs. Podem
pousar à noite, recebem roupa limpa, fazem sua refeição, recebem pessoalmente
seu travesseiro e o cobertor para se abrigarem na cama que lhe é destinada. São
colocados em contato com suas famílias. Assim podem melhor redefinir seu rumo,
e buscar a saída para a sua situação.
Tentavam uma fantasia enganosa.
Acabam descobrindo uma riqueza diferente, que podem encontrar dentro de si
próprios. Não há muros que detenham a vocação humana para a sua realização
pessoal e o relacionamento fraterno com todos.
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